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27 de outubro de 2013

Claudia Raia em rotina de ensaios para novo musical

Gabriel Perline - O Estado de S. Paulo


Faltavam poucos minutos para o relógio marcar 14h e Claudia Raia soava eufórica. Da porta de entrada de um estúdio na zona oeste, a entonação era de quem parecia satisfeita com algo bom que lhe ocorrera. Paredes, escadas, corredores e, enfim, o encontro. Estava ela, em pé, atrás de um computador, ao lado da coreógrafa Angelique Ilo, mostrando fotos promocionais de Crazy For You, seu novo musical, produzidas no dia anterior. “Venha ver também. Deu um trabalho enorme, mas ficaram lindas. Nessa aqui (batendo no monitor)eu tive que pular não lembro quantas vezes para dar este efeito esvoaçante ao vestido”, lembrou.

E, realmente, as imagens estavam impecáveis. Depois destas, várias outras, de trabalhos anteriores, surgiram na tela. “Para mim tem que ser tudo caprichoso. O contrário não justificaria meu esforço”, comentou.



Jarbas Homem de Mello entra na sala de produção esbaforido. “Meu, isso cansa. São dez horas diárias cantando, dançando, malhando. Nem um jogador de futebol tem uma maratona como a nossa”, disse o ator, enquanto Claudia usava uma toalha para secar seu rosto suado. “O público vê o musical impecável, mas ninguém sabe o quanto ralamos antes de deixar pronto”, acrescentou a atriz. E esse era o objetivo do nosso encontro: conhecer a rotina exaustiva do casal, um mês antes da estreia no Complexo Ohtake Cultural, antigo Teatro Geo.
Um tropeço na aula de sapateado, dias antes, deixou a panturrilha roxa. Na perna, compressas de gelo. “Dói muito, mas não dá para parar. Estou tentando pegar leve, mas ainda temos muito a fazer por aqui”, disse.

Mancando levemente e apoiada no corrimão, Claudia nos conduziu até uma das salas de ensaio, a única livre de todo o complexo. “Vou me esconder aqui um pouco, mas logo nos encontrarão”, brincou.

A entrevista começa com Claudia explicando o motivo de fazer uma versão brasileira deCrazy For You, sucesso na Broadway em 1992, com texto de Ken Ludwig e músicas dos aclamados irmãos George e Ira Gershwin. “Assisti em Nova York e, ao final, eu não conseguia levantar. Estava arrebatada, emocionada e, naquele momento, tive a certeza de que um dia eu também seria Polly Baker (personagem principal)”. E por que esperou 21 anos? “Se hoje é difícil montar um musical no Brasil, imagine naquela época. Além do custo de produção, outro grande problema era encontrar um homem bonito, que soubesse atuar, cantar e sapatear muito bem. Não havia quem fizesse as três coisas ao mesmo tempo. Depois de conhecer o trabalho do Jarbas (Homem de Mello), tive a certeza de que Crazy For You poderia ser feito no Brasil”, explicou.


O espetáculo é uma grande comédia e ganhou a atenção da crítica internacional principalmente por sua coreografia, premiada com um Tony, bastante pautada pelo sapateado. Para reproduzir o sucesso de lá, Claudia escalou a coreógrafa norte-americana Angelique Ilo, que atuou na montagem original. “Ela é muito técnica e não deixa um respiro fora do tom”, disse. A bem-sucedida parceria com o diretor José Possi Neto emCabaret é repetida nesta peça. A tradução é assinada por Miguel Falabella, amigo de longa data. “Somos irmãos e quando ofereci este trabalho, ele se sentiu honrado em ter a oportunidade de traduzir Gershwin”.

A conversa parte para sua vivência no humor, com direito a retrospectiva de sua carreira e lembranças de situações irreverentes. “Sempre fui galhofeira. Posso passar essa imagem de mulher elegante, séria, mas sou muito desastrada e divertida. Gosto de rir e provocar o riso.” As gargalhadas somem quando o assunto é patrocínio. Na opinião de Claudia, alguns empresários ainda têm medo de investir em projetos culturais – e ela critica o atual modelo de meia-entrada. “Não sou contra, mas esse processo precisa ser revisto, porque eu também sou produtora, emprego 120 pessoas com este espetáculo e o lucro de bilheteria não banca os custos. Te dou um exemplo: uma sessão de Cabaret, em Brasília, estava lotada. Haviam 2 mil assentos e 1.998 foram meias-entradas. Eu não pago meio salário aos atores ou metade do aluguel ao dono do teatro. Deveria haver uma cota de meias-entradas por exibição. Ou, no mundo ideal, o Governo financiar a outra metade que não recebemos nas bilheterias”, refletiu.

Um dos produtores entra e pede desculpas por interromper a conversa, mas Claudia precisaria trocar de roupa em cinco minutos e descer ao salão principal, pois o elenco a aguardava para passar o 1º ato.



Grupo reunido, Possi e Angelique instruem os atores com dicas que chegavam ora em inglês, ora em português. O idioma não pareceu dificultar o aprendizado do elenco, que conseguiu, depois de quatro horas e cenas repetidas inúmeras vezes, entregar a primeira parte do musical como os diretores queriam. “Todos os dias sou recebida com sorrisos e abraços, seguidos de um duro trabalho, criatividade e determinação. Sou grata pela oportunidade de trabalhar com este grupo”, disse a coreógrafa.

O relógio marcava 21h e os atores recolhiam suas bolsas e partiam em direção à saída. Claudia e Jarbas, sentados no chão, respiravam fundo e aproveitavam os poucos minutos de descanso. “Ainda não acabou. No dia que não puxamos ferro, fazemos pilates”, disse Jarbas.

Já na academia, com o cansaço estampado nos rostos, eles não desanimam. Era a hora final da maratona, com exercícios de força, equilíbrio e concentração. “É uma etapa fundamental da nossa preparação”, suspira Claudia ao finalizar a bateria de exercícios, às 23h15. “Precisamos dormir. Amanhã, às 9h, faremos novamente tudo isso que você viu”.

Fonte: Estadão